O OUTRO LADO DA MOEDA

Porque coisas ruins acontecem a pessoas boas? Por que o cristão sofre enquanto Deus, que tudo pode e tudo sabe, parece estar impassível e insensível a essa dor? Essas são perguntas que surgem ao longo da vida e que acabam por fragilizar a fé de muitos cristãos. Num contexto em que milhares de pessoas são cooptadas por igrejas e pastores sob a promessa de uma vida próspera, feliz e plena, situações de sofrimento são o estopim para questionamentos acerca da bondade e do amor do Pai para aqueles que o servem.

Acontece que, em nenhum momento, Deus nos prometeu uma vida isenta de angústia e dor e qualquer afirmação a esse respeito é falsa e enganadora. O próprio Jesus disse: “Tenho-vos dito isso, para que em mim tenhais paz; no mundo tereis aflições, mas tende bom ânimo; eu venci o mundo” (Jo 16:33). Lembro-me de um artigo de John Wimber, da Igreja Vineyard, que relatou sobre um estudo estatístico sobre oração e cura. No texto, ele conta que 80 grupos de intercessores, treinados durante anos, oraram uma hora por dia durante seis semanas com 600 pessoas sofrendo de vários tipos de enfermidades, angústias e doenças emocionais.

Os estudos revelaram que 25% das pessoas foram curadas, 55% tiveram melhora relativa e 20% não apresentaram melhora. Ou seja, 75% das pessoas não receberam a cura. Então, porque nem todos são curados? Porque o eixo do Cristianismo não é providenciar bem-estar e saúde perfeita para seus seguidores; o bem maior é a perfeição. Tenho visto milagres tais que não posso duvidar que Cristo cura e transforma qualquer circunstância ainda hoje, como afirmam as Escrituras.

No entanto, é preciso ter coragem de enfrentar uma realidade existencial: nós sofremos, mesmo sendo filhos salvos de Deus, porque Ele está preparando-nos e aperfeiçoando-nos. O alvo de Deus é a nossa perfeição mesmo que através de sofrimento, se necessário. “Sabendo que a prova da vossa fé opera a paciência. Tenha, porém, a paciência a sua obra perfeita, para que sejais perfeitos e completos, sem faltar em coisa alguma” (Tg 1:3-4).

 

Deus não é fonte de maldade. Pelo contrário: Ele é bom, tudo o que Ele faz é pelo bem e tem como fundamento. Seu incondicional amor. Na obra Crônicas de Nárnia, C. S. Lewis conta que um garoto mal e cruel foi transformado em um dragão e, ao conhecer um leão dourado, aceita o chamado para segui-lo. O leão dourado representa o Espírito de Deus e, após uma longa jornada, ao chegarem a uma lagoa cristalina, diz ao dragão que, para banhar-se naquelas águas, deve livrar-se de sua pele. À medida que despia-se, nova pele de dragão aparecia. Até que o leão decide ajudá-lo, arrancando a pele com suas garras poderosas. Foi um processo longo e doloroso até que, nu, entrou na água e transformou-se no garoto.

Do dragão ao jovem transformado foi preciso atravessar momentos de muita dor como parte essencial do processo de cura. Foi necessário perseverar e confiar. Precisamos ter em mente que Deus tem o poder de curar e realizar milagres, segundo a Sua vontade. Precisamos entender que não sofremos, necessariamente, porque estamos em pecado ou por falta de fé. Precisamos aceitar que nosso sofrimento pode ser necessário ao aperfeiçoamento. E, mais importante, precisamos confiar que nosso Pai Celeste, o “leão dourado”, sabe o que está fazendo.